Design, arte e café para respirar ☕️
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A falta que a gente faz
Minha adolescência foi na era dourada dos blogs. Todos nós tínhamos blogs pessoais e comentávamos nos blogs uns dos outros. Se você é muito jovem, os blogs eram como canais no YouTube sobre o cotidiano, mas em formato escrito.
A coisa mais engraçada é que a fonte padrão para leitura era a menor possível. Naquela época, era comum ler um blog com fonte de 12px. Hoje, não consigo mais enxergar isso.
Faz uns dois meses que trouxe alguns artigos para cá. A ideia era criar um blog para exercitar a escrita, uma forma de não perder o hábito.
Agora tenho 37 anos. Nesse caminho até aqui, perdi e ganhei muitas coisas. Mas às vezes me bate aquele desespero de estar me perdendo nos excessos da tecnologia. Ainda me sinto uma mariposa tecnológica, mas estou consciente disso. Venho percebendo que, de forma geral, as pessoas estão percebendo seus próprios excessos e começando a desmembrar seus smartphones em câmeras digitais, iPods, telefones que só recebem ligações, WhatsApp apenas no computador e outras soluções, uma mais criativa que a outra. No meu caso, não cheguei a tanto, mas tenho reduzido meu tempo de uso inconsciente de tela.
Ao longo do caminho da vida, traçado da melhor maneira que pude, ainda estou redescobrindo meus próprios prazeres: o que gosto de fazer, os lugares que quero conhecer. Hoje, muito de mim é resgate, e me vejo com muito mais carinho do que antes. Chega um certo momento na vida em que a gente precisa parar de se punir e começar a se tratar com mais carinho e respeito, entendendo que o gosto amargo do erro passa e que o foco deve estar no que se pode fazer aqui e agora.
Metade de mim queria estar assistindo a algumas aulas de dança, porque meu corpo precisa se exercitar; a outra metade queria estar escrevendo algo, e todo o meu subconsciente queria estar fazendo trilhões de outras coisas. É como se a mente nunca se permitisse o mais absoluto nada.
Nossa geração, em algum momento, foi ingênua o suficiente para acreditar que seria bem-sucedida aos 30 anos. Hoje, sabemos que nada disso aconteceu. Não como esperávamos. Houve sucesso, mas não aquele que nos foi vendido. Esse sucesso foi caro: levou nossa alma de criança, nossa saúde física e mental, nossa capacidade de viver em sociedade, e hoje muitos de nós vestimos a desculpa de que a solitude é cool. Somos pedaços resgatados, tentando formar algo que se pareça com o tempo em que havia inocência. O que formamos é outra coisa totalmente diferente, mas com mais sabedoria e disposição para ver o dia nascer de novo.
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Aos pedaços
Me acostumei a estar aos pedaços
e a me remontar tudo outra vezE se precisar despedaçar de novo
Tiro de letra ao cair aos pedaçosO luto e eu somos íntimos
Porque quando em luto perco
Em luto me remontoSou artista de mim mesma
e cada vez que me despedaço
Quebro formando outros desenhos
E me remonto como outra obra de arteIsabella Felix
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Plástico bolha
Neste quarto sem dimensão
Sinto os espaços vazios
Ainda vou vestir aquela roupa
Caber em todos os espaços
Vou deitar na minha cama
Gozar em vidro estilhaçado
Me sentir aos pedaços
A mercê de um acaso
Deixa eu te chamar
No menor dos sussurros
Te prender na minha teia
Devorar o que sobrou de você
E se restar alguma coisa
Deve ser algo semelhante a mim
E você pode até pensar que sou
Pequena e intragável
Mas se te chamo para fugir comigo
É para fazer um estrago onde passarmos
Pode caminhar sem medo baby
Eu me cortei no caminho por vocêIsabella Felix
Quando escrevi isso, estava meio sonolenta. Não sabia bem se estava dormindo ou acordada. Também não pensei muito. Eu apenas lembrava das palavras que havia sonhado e comecei a escrever. Não sei te dizer, leitor, o que aconteceu comigo. De repente esse tipo de coisa me atormenta. Como um chamado para a poesia. Logo eu, que muitas vezes achei que ela havia me abandonado. Sigo orgulhosa, de cada palavra que escrevo, cada pedaço de arte que brota de mim para o universo.
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Desgaste
O que me corrói é o viver
Conforto é saber que não estou só
Estamos intimamente feridos
Nadando desesperadamente
e jamais encontrando a superfície
Isabella Felix
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Mariposa tecnológica
A mariposa é um dos animais mais supersticiosos que existem por estar cercada por simbolismos. Nos falavam que não devíamos tocá-las e depois coçar os olhos para não ficarmos cegos. Em muitas culturas elas também representam transformação, libertação e morte. Ou um ser que transita entre o mundos dos vivos e dos mortos. Foi assim que me senti ao refletir sobre a forma que consumo tecnologia. Uma mariposa atraída pela claridade. Lembro que quando era criança, nossa preocupação era saber se tinha comida na mesa, se eu estava indo para a escola e se a Telefunken estava funcionando. Se tem uma coisa que lembro da minha infância são os espaços vazios, os poucos móveis antigos e o chão no cimento. Um cheiro familiar de amor e poeira. Ao refletir sobre minha infância fiquei me perguntando quando foi que nos tornamos meros lacaios tecnológicos. Estava com saudades de desenhar no antigo Samsung Tab S6 Lite. Adorava desenhar com ele mas o desempenho não era bom o suficiente. Engasgava demais quando eram desenhos muito complexos. Acabei me desfazendo dele para comprar um iPad 9 mas não me acostumei com a Apple pencil e nem com o tablet em si para tal finalidade. E tive o mesmo problema de desempenho. Não me atrevo a refletir sobre meus gastos porque isso me frustraria mais. Quando percebi que gostava da simplicidade dos apps que usava no tablet da Samsung e que me sentia confortável com aquela canetinha tão simples é que compreendi melhor meu próprio papel como designer. Precisei dar uma volta enorme para perceber que não precisava tanto assim do ipad, que poderia resolver meus problemas de sincronização de apps de outras formas, mesmos que não sejam meus apps favoritos. A verdade é que nunca estamos satisfeitos e isso é assustador.